Trecho do texto publicado no site http://www.culturabrasil.pro.br/olga.htm
Um Telegrama dos aliados e uma carta de Olga
| Olga Benário |
![]() |
| Luís Carlos Prestes |
Cercado de amigos ele se preparava para subir a
escada do vagão-leito, quando um jovem chegou correndo, abrindo passagem entre
os que se despediam do chefe comunista:
_ Capitão! Capitão Prestes! Um momento, não
embarque!
Temeu-se uma tentativa de agressão, mas o rapaz se
identificou:
_ Sou repórter da agência de notícias United Press.
Nós tínhamos pedido às sucursais européias que buscassem informações sobre
Olga Benario, e acabamos de receber este telegrama sobre ela, enviado pelo
correspondente em Berlim.
Ansioso, Prestes levou o pedaço de papel aos olhos
e leu-o com o rosto crispado, diante do silêncio dos amigos que o fitavam.
Levantou a cabeça e disse apenas três palavras:
_ Olga está morta.
Era um despacho curto, sem muitos detalhes:
“Berlim - As autoridades aliadas acabam de
informar que entre as 200 mulheres executadas na câmara de gás da cidade alemã
de Bernburg, na Páscoa de 1942, estava a senhora Olga Benario, esposa do
dirigente comunista brasileiro Luís Carlos Prestes.”
Prestes entrou no que já começava a se movimentar
rumo ao Rio de Janeiro, caminhou por entre as poltronas em silêncio, sentou-se
e leu mais uma vez a notícia, antes de guardar o papel no bolso do paletó.
Só muitos anos depois é que ele receberia a última
carta que Olga escrevera a ele e à filha, ainda em Ravensbrück, na noite da
viagem de ônibus que a levaria à morte em Bernburg. Transcrevo literalmente
pela beleza da peça e para que se possa conhecer melhor o coração da mulher:
“Queridos:
Amanhã vou precisar de toda a minha força e de toda a minha
vontade. Por isso, não posso pensar nas coisas que me torturam o coração, que
são mais caras que a minha própria vida. E por isso me despeço de vocês agora.
É totalmente impossível para mim imaginar, filha querida, que não voltarei a
ver-te, que nunca mais voltarei a estreitar-te em meus braços ansiosos.
Quisera poder pentear-te, fazer-te as tranças - ah, não, elas foram cortadas.
Mas te fica melhor o cabelo solto, um pouco desalinhado. Antes de tudo, vou
fazer-te forte. Deves andar de sandálias ou descalça, correr ao ar livre
comigo. Sua avó, em princípio, não estará muito de acordo com isso, mas logo
nos entenderemos muito bem. Deves respeitá-la e querê-la por toda a tua vida,
como o teu pai e eu fazemos. Todas as manhãs faremos ginástica... Vês? Já
volto a sonhar, como tantas noites, e esqueço que esta é a minha despedida. E
agora, quando penso nisto de novo, a idéia de que nunca mais poderei estreitar
teu corpinho cálido é para mim como a morte. Carlos, querido, amado meu:
terei que renunciar para sempre a tudo de bom que me destes? Conformar-me-ia,
mesmo se não pudesse ter-te muito próximo, que teus olhos mais uma vez me
olhassem. E queria ver teu sorriso. Quero-os a ambos, tanto, tanto. E estou
tão agradecida à vida, por ela haver me dado a ambos. Mas o que eu gostaria
era de poder viver um dia feliz, os três juntos, como milhares de vezes
imaginei. Será possível que nunca verei o quanto orgulhoso e feliz te sentes
por nossa filha?
Querida Anita, Meu querido marido, meu garoto: choro
debaixo das mantas para que ninguém me ouça pois parece que hoje as forças não
conseguem alcançar-me para suportar algo tão terrível. É precisamente por isso
que me esforço para despedir-me de vocês agora, para não ter que fazê-lo nas
últimas e difíceis horas. Depois desta noite, quero viver para este futuro
tão breve que me resta. De ti aprendi, querido, o quanto significa a força de
vontade, especialmente se emana de fontes como as nossas. Lutei pelo justo,
pelo bom e pelo melhor do mundo. Prometo-te agora, ao despedir-me, que até o
último instante não terão porque se envergonhar de mim. Quero que me entendam
bem: preparar-me para a morte não significa que me renda, mas sim saber
fazer-lhe frente quando ela chegue. Mas, no entanto, podem ainda acontecer
tantas coisas... Até o último momento manter-me-ei firme e com vontade de
viver. Agora vou dormir para ser mais forte amanhã. Beijos pela última vez.
Olga.”
Lázaro Curvêlo Chaves

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